Diálogo entre um médico e o paciente:
- Continua sentindo muitas dores?
- Com certeza, doutor.
- Você tomou todos os remédios que eu lhe receitei na última vez em que esteve aqui?
- Com certeza. Mas, doutor, o que será que eu tenho, hein?
- Para começar, com certeza você sofre da Síndrome de Ofélia.
A Síndrome de Ofélia - só se abre a boca quando se tem certeza - disseminou-se nos últimos anos, em conversas, na mídia e até nas salas de aula. Trata-se do compulsivo "com certeza!", uma daquelas epidemias linguísticas difíceis de debelar, como a epidemia do "a nível de" e a do "tipo assim" (hoje menos perigosas) e a do gerundismo, que vai estar continuando a se difundir por mais uma década...
Faça o teste.
Convide um amigo para uma festa e ele, sem ao menos perguntar dia e endereço, afirmará: "Estarei lá, com certeza!".
Pergunte a um político se está preocupado com o tema da educação. Sua resposta infalivelmente será: "Com certeza!".
Ligue a TV, escolha qualquer programa em que todos falam sobre o que pouco entendem, e logo ouvirá alguém dizer: "Com certeza!".
Essa estranha "certeza" reaparece nos diálogos em que a pessoa, querendo concordar com a nossa tese, responde de bate-pronto, mesmo sem ter pensado ou sequer ouvido o que lhe expusemos: "Com certeza!".
"Com certeza" tornou-se a forma preferida de iniciar toda resposta, ou de apenas suprir a absoluta falta de respostas. Preste atenção.
Estive na Bienal do Livro neste final de semana e pude constatar que a praga atinge até nossos escritores. Entrevistando um autor, perguntei-lhe:
- E o seu livro? Vendendo muito?
- Com certeza. Já se foi metade da tiragem.
- Pretende dar continuidade ao tema?
- Com certeza. A gente não pode parar de escrever, não é?
- Com certeza...
Este "com certeza" pega e não desgruda. E não faz discriminação de idade ou classe social!
A síndrome pode ser adquirida por falta de higiene linguística. Remédio? Tomar consciência do cacoete verbal e ampliar o vocabulário, estudar, ampliando também nossa visão de mundo.
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